Há 19 anos, o Brasil dava um passo importante na luta pelos direitos das mulheres ao sancionar a Lei Maria da Penha. Considerada uma das legislações mais avançadas do mundo no enfrentamento à violência doméstica e familiar, a lei representou, desde o início, muito mais do que um instrumento jurídico. Ela é símbolo da resistência de milhões de mulheres que, historicamente silenciadas, passaram a ter respaldo legal para romper o ciclo da violência.
No entanto, quase duas décadas depois, é preciso admitir com franqueza que a lei sozinha não é suficiente. Ela pode punir, mas não educa. Pode proteger, mas não previne. Pode afastar o agressor, mas não rompe, por si só, a estrutura machista que ainda naturaliza a violência contra a mulher no cotidiano de muitas famílias brasileiras.
Vivemos em um país onde, a cada 4 minutos, uma mulher é agredida fisicamente. Onde o feminicídio, crime tipificado apenas em 2015, segue em números alarmantes. Onde meninas crescem aprendendo a temer os próprios passos. E onde o sistema de justiça, ainda sobrecarregado e muitas vezes insensível, falha em oferecer respostas rápidas, eficazes e humanas.
A Lei Maria da Penha é, sim, um marco civilizatório. Mas seu poder depende da ação integrada do Estado, da sociedade e das instituições. É preciso garantir delegacias especializadas, abrigos seguros, medidas protetivas eficazes, promotorias preparadas e juízes comprometidos com a causa. É urgente investir em campanhas educativas, começando pelas escolas, para ensinar desde cedo que respeito e igualdade não são concessões, mas direitos.
Como advogado e fundador do projeto Justiça Para Todos, testemunho diariamente as barreiras que muitas mulheres ainda enfrentam para ter acesso à informação, orientação jurídica e acolhimento digno. Muitas sequer sabem que têm direitos. Outras já perderam a esperança de vê-los respeitados.
Neste aniversário da Lei Maria da Penha, o melhor presente que o Brasil pode oferecer às mulheres é coragem. Coragem para aplicar a lei com rigor, coragem para romper pactos de silêncio e coragem para construir uma cultura de paz e equidade. Que a cada novo ano, possamos menos comemorar e mais realizar. Porque justiça para todas não pode ser apenas um ideal. Tem que ser realidade.
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Renato Rocha, advogado |
Renato Rocha, advogado e fundador do projeto Justiça Para Todos